Rota do Veneto: Burano

Publicado por flag-pt Catarina Frazão de Faria — há 5 anos

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Etiquetas: Geral

Visitar Burano é uma daquelas oportunidades imperdíveis! Apesar de ser uma ilha mais pequena quando comparada com as principais da Laguna Veneta, é, na minha opinião, a mais encantadora.

A ilha, localizada a nordeste de Murano, é mundialmente conhecida pelas suas casas piscatórias típicas; ultra-coloridas e dignas de um cenário verdadeiramente pitoresco, eis como se vê extrapolada a magia de Burano.

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As famosas casinhas às cores em Burano.

Uma outra característica de relevo sobre Burano, que eu desconhecia na altura, é a sua tradição plurissecular no fabrico do “merletto”, um tipo de bordado muito estimado, cuja inspiração pode correlacionar-se maioritariamente com elementos da actividade piscatória, nomeadamente as redes.

Muito embora seja actualmente um destino muito turístico, derivado de uma forte aposta em dar a conhecer além fronteiras os seus maravilhosos atributos, a ilha de Burano era descrita, desde os tempos da República de Veneza (séculos IX a XVIII), como uma das mais “pobres”, pelo facto de a população subsisitir essencialmente das actividades de pesca e agricultura. Foi precisamente por intermédio da expansão do artesanato local que a ilha conseguiu alguma riqueza monetária, mas mais importante que isso, a riqueza patrimonial que agora a torna um local tão curioso.

Se estivermos na região, esta ilha sem dúvida que vale a pena de uma bela passeata, seja de manhã ou de tarde, que pode facilmente ser enquadrada num circuito de um dia com Murano.

Como chegar?

Burano é alcançável através da linha 12 do Vaporetto, sendo esta a única que permite a comunicação com a ilha. Partindo de Veneza (Fondamente Nove), passa primeiro por Murano (Faro), Mazzorbo e Torcello, demorando cerca de 55 minutos. Se sairmos de Murano, o barco leva 41 minutos.

De Burano, esta linha segue em direcção a Punta Sabbioni, já na extremidade sul do Litorale del Cavallino, que separa a lagoa veneta do Mar Adriático. É interessante mencionar que esta linha costeira é considerada um dos mais importantes destinos balneares de Itália…

No artigo sobre Murano já tinha deixado algumas informações sobre os bilhetes ACTV que regem a utilização do Vaporetto na Laguna Veneta, sendo de útil conselho a consulta do sítio oficial

O que fazer?

O desembarque do Vaporetto tem lugar na ponta norte da ilha, e a partir daí somos livres para percorrê-la à nossa vontade. O turismo oficial de Burano  tem variadíssimas sugestões de locais de interesse, restaurantes e alojamento local. Assim, da minha parte deixar-vos-ei somente alguns destaques, com base naquilo que foi o meu reconhecimento da ilha.

Percorrendo a Viale Marcello, onde surgem os primeiros ateliers da arte do “merletto”, rapidamente chegamos à Fondamenta S. Mauro, onde o Rio Ponticello, o principal canal de Burano, nos deixa desde logo embasbacados com o cenário.

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Rio Ponticello - Fondamenta S. Mauro (esquerda) e Fondamenta degli Assassini (direita)

Burano, a terra das mil cores, é giríssima! O principal apanágio é claramente a vivacidade que os tons contrastantes, mas em perfeita harmonia, transmitem. É impossível não ficar fascinado!

Consta que a explicação para as casas terem sido assim caiadas ainda está por ser desvendada, existindo várias hipóteses. Uma é a de que cada cor representa uma determinada família, de modo a distinguir as propriedades, já que em Burano existia uma grande repetição de apelidos, razão pela qual foi também generalizado o uso de um sobrenome.

A versão mais fundamentada parece ser a de que a diferente coloração das casas pretendia funcionar como auxílio e recordação para os pescadores, não só como forma de avistarem facilmente Burano e não se perderem havendo nevoeiro, mas também como modo de reconhecerem a sua própria casa, o que até lhes daria um certo alento para suportarem os longos períodos de pesca, longe das suas famílias.

Surge ainda o mito urbano de que as cores quase psicadélicas servissem para afastar o mau olhado e os demónios… Seja como for, resultou muito engraçado a pintura de todas as casas de diferentes tonalidades, tendo tornado Burano uma ilha única no mundo.

Segundo dizem, para desfrutar de Burano é necessário perdermo-nos, explorando as ruas da ilha de acordo com os que nos vai cativando…

Assim, sem qualquer mapa ou indicação de onde se encontravam os pontos de destaque, comecei a andar descontraidamente para Este ao longo do Rio Ponticello e em três tempos dei por mim num dos locais mais emblemáticos. Seguindo o canal, tanto pela direita como pela esquerda, deparamo-nos sempre com um desenho urbanístico sem igual.

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Burano: “um jogo de contrastes”

O coração da ilha tem lugar na Piazza Baldassare Galuppi – a única praça da cidade – à qual podemos facilmente aceder percorrendo a rua homónima, desde o ponto de entroncamento do Rio Ponticello (ilustrado na foto acima). É onde se encontram a maior parte das lojas de artesanato local e de recordações, dos restaurantes, pastelarias e geladarias, tendo toda esta zona sido construída por soterramento de um antigo canal.

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Entrando na Piazza Baldassare Galuppi.

Ainda antes de chegar à zona central, enfiando por uma perpendicular encontramos a casa mais icónica da ilha: a casa de Bepi Suà, caiada de forma multicolor com padrões geométricos muito particulares. O senhor Bepi (Giuseppe Toselli) vendia caramelos na Piazza  Galuppi e todas as tardes pintava mais qualquer coisa na fachada da sua casa… É, sem dúvida, a mais colorida de Burano!

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“La casa di Bepi Suà” 

Algo que muito apraz aos visitantes de Burano é a paz de alma que a ilha emane. Aqui reina uma sensação enorme de tranquilidade e felicidade, representada nas faces dos mais velhos, experientes artesãos do “merletto buranello” que vemos trabalhar, rindo e cochichando – particularmente nos larguinhos por entre ruas, os chamados “campielli”, que são tipicamente populares na região veneziana – e nos cumprimentam invariavelmente com um alegre “Buongiorno”, convidando a entrar nas suas lojas; assim como na energia dos mais novos, que correm e brincam na rua. 

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“Merletto buranello” – o bordado de Burano

Uma das principais atracções turísticas localizada na Piazza é o Museo del Merletto. Aberto no final do século XX, está sediado numa das antigas escolas da arte do bordado que haviam sido patrocinadas pela aristocracia veneziana no final do século anterior para relançar o “Merletto”.

Já sem a importância que outrora fora impulsionada por Napoleão, coube a algumas famílias ricas financiar os projectos de renovação. Por diversos motivos aliados à situação pós-guerra, nomeadamente a preterência da roupa feita à mão pelo seu elevado custo, mas também dada a pouca translação de novas linhas estilísticas para os modelos iconográficos, não acompanhando a evolução da moda, esta arte tradicional entraria novamente em declínio.

Não deixa de ser uma história interessante, esta do “Merletto”, cujo fabrico ao longo dos tempos foi sofrendo altos e baixos… O museu – com um custo de entrada 5€ - permite então retroceder no tempo, dando a conhecer, entre outras coisas, os mais preciosos detalhes desta técnica.

Distinguindo-se pela extrema complexidade de desenho e execução, a base de trabalho é a utilização de apenas agulha e fio muito fino, de alta qualidade – tanto que fez nascer diversos pontos de costura, por exemplo o ponto Veneza e o ponto Burano – e o processo de produção do “Merletto” resulta muito longo (inclusive podendo durar mais de uma dezena de anos), pelo que os produtos originais chegam a valer milhares de euros

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Museo del Merletto

Para lá da Piazza, já em direcção à Lagoa, ergue-se a ratória San Martino Vescovo – actualmente a única igreja em serviço na ilha – cujo majestoso campanil inclinado se veio a tornar um símbolo de Burano.

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Campanile di San Martino

Em tom de curiosidade, o desvio deve-se à cedência parcial das arquibancadas, assentes nas típicas palafitas da região lagunar veneziana, que, ainda que tenham como objectivo evitar o arrastamento das construções pela corrente dos canais, não deixam de apresentar alguma fragilidade.

Nas casas de Burano encontramos também alguns murais alusivos ao quotidiano dos seus habitantes, com referências à pesca e aos motivos mais emblemáticos da ilha.

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Casa em Burano pintada com cenas da vida quotidiana

A rua Rio Terrà del Pizzo, leva-nos à Fondamenta del Pizzo, onde existe um espaço verde agradável para fazer um piquenique enquanto apreciamos as vistas para a Lagoa. Foi o que fiz, já que tinha levado uma merendazita…

De qualquer forma, Burano é também muito conhecida em termos de gastronomia, especialmente pelos pratos de peixe. Por isso, almoçar nos restaurantes típicos é uma sugestão a considerar! Na “ratória buranella” servem peixe fresco muito bom, assim como a grande especialidade da ilha, o “risotto di gò”, cuja estrela é o gobião, um peixe típico da Laguna Veneta. Para sobremesa, o clássico “gelato italiano” é sempre uma escolha acertada, mas Burano também se faz valer por alguns doces típicos, a saber “Bussolà” e “Esse”, que podem ser comprados nas várias pastelarias.

Como me apetecia um gelado -  penso que ainda só tinha comido um desde que chegara a Itália – decidi experimentar uma combinação diferente de sabores: noz de Macadâmia + Bellini. Posso dizer que este foi um dos melhores gelados que comi em Itália nos últimos 5 anos!

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À beira do canal: “um gelado delicioso”

Uma vez que ainda tinha algum tempo em Burano até ter de apanhar o Vaporetto para Veneza (onde iria depois apanhar o comboio de regresso a Milão), decidi continuar a explorar a ilha.

Do local onde almocei, o Rio Zuecca divide a zona S. Martino Sinistra da Giudecca, onde a Fondamenta Pescheria toma destaque pelos seus mercados de peixe. É já sabido que a pesca tem um papel fundamental na história da ilha de Burano… Ainda hoje na “Pescheria Nuova”, mas também na “Pescharia Vecchia”, as bancas se enchem todos os dias de imensas espécies de peixe, moluscos e crustáceos.

Seguindo este canal,  chegamos ao ponto de encontro com o Rio Ponticello, num local muito apreciado pelos turistas, chamado “Tre Ponti”. Pelo caminho, claro está, as casinhas coloridas vão sempre fazendo as delícias dos nossos olhos, mas é aqui nesta ponte que podemos contemplar um dos visuais mais bonitos de Burano.

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Rio Ponticello - vista de Tre Ponti: lado norte

Precisamente por ser um dos pontos mais bonitos da ilha, onde muitos casais tiram fotos abraçados, aproveitando um pano de fundo rico em timbres coloridos, esta famosa ponte ficou também conhecida como a Ponte do Amor (em inglês “Love Viewing”).

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Rio Ponticello - vista de Tre Ponti: lado sul

Burano é indiscultivelmente um vilarejo cheio de vida, sem que se sinta qualquer frenesim cosmopolita. Na minha perspectiva, toda a ilha se retrata como um hino ao gáudio de viver, através do uso da cor, algo que só podemos verdadeiramente vivenciar se a visitarmos. Não obstante, esta sensação é-nos transmitida de forma excepcional no videoclipe da canção “La Stessa”, de Alessandra Amoroso, rodado exclusivamente em Burano e que nos transmite (pelo menos a mim) imensa alegria.

Acaba por ser nas ruas menos turísticas que encontramos as casas mais brilhantes e vivas, pintadas de todas as cores do arco-íris, e cuidadas ao pormenor com detalhes arquitectónicos igualmente encantadores. A enfeitar as fachadas vemos também variadíssimas flores esplendorosas, criando por vezes um choque de cores, e nas varandas dispõem-se vasos lindíssimos com detalhes em vidro de Murano.

Nada é deixado ao acaso, e esta “arte” de colorir as casas tornou-se efectivamente uma paixão dos habitantes de Burano. Aqui experienciamos momentos únicos, registados pelo clique da máquina fotográfica, que se congelam no tempo e perduram na memória.

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Uma entre as muitas casinhas coloridas de Burano. #felicità

Mas claro que é igualmente deleitoso passear junto aos canais, admirando a beleza dos reflexos das cores na água. Neste contexto, um dos canais mais pitorescos da ilha, pela posição favorável à luz, é o Rio Terranova, que separa a Terranova de S. Martino. A Fondamenta Cao di Rio torna-se um local idílico, e dizem que as vistas para Torcello, a norte, são líndissimas, tanto que ver o sol nascer virados para esta zona da Lagoa é simplesmente espectacular.

Esta outra zona de Burano (que não cheguei a visitar), para além da vivacidade das cores, é muito conhecida pelos tais “campielli”, cujas casas nas esquinas, com as roupas penduradas nos estendais, protagonizam um cenário cenográfico altamente italiano.

Com isto, termino o meu relato de uma esplêndida tarde de Fevereiro passada em Burano! Apesar do frio que se fazia sentir - penso que a Primavera seja a melhor altura para visitar as ilhas da Laguna Veneta - foi um dos destinos em Itália que mais gostei de conhecer

Aconselho vivamente! 

São muitas as ilhas da lagoa, porém penso que Murano e Burano sejam aquelas de maior interesse cultural para serem visitadas...

A minha Rota do Veneto teve a duração de apenas um dia (tendo sido mais do que suficiente para explorar os principais highlights), mas como que tinha começado em Veneza no dia anterior... A experiência incrível que é foi viver o Carnaval Veneziano será o tema do próximo texto!


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