A Bruxa da Piazza Bra
No centro da Piazza Bra estava uma velha gigante.
A velha não estava bem conservada. Era feia, diga-se. Tinha os olhos esbugalhados, mas que nada pareciam ver. Um nariz adunco horrível. Vermelhidão espalhada para toda a face. No seu cômputo geral, parecia estar a sofrer de algum tipo de doença séria. Os seus cerca de quatro metros de altura também não a ajudam a tornar-se mais atraente. A vassoura entre as mãos, os óculos quebrados e o chapéu roxo davam o toque final.Retiravam qualquer réstia de dignidade que aquela velha pudesse ter. Vendo um monte de palha sob os seus pés, fui questionar um nativo italiano sobre o que se iria ali passar. Ele parecia estar muito interessado na velha, pelo que presumi que soubesse de alguma coisa que me estava a escapar. Tinha razão.
Começou por me dizer que hoje, dia seis de janeiro, é o Dia da Epifania.
Em Portugal, como bem saberão, é Dia de Reis. Disse-me que era uma grande celebração e que tal como em Verona, muitas outras cidades tinham as suas próprias velhas. Ou melhor: bruxas. Comecei logo a pensar se também iria ter um grupo de crianças com vozes agudas a pedir esmola à porta, mas rapidamente o senhor me explicou no que consistia e retirei esse pensamento fétido da minha mente.
O senhor disse-me que, mais precisamente, o dia de hoje era o dia de celebrar a Befana.
Resumidamente, a Befana é o Pai Natal dos italianos! Os italianos têm sempre uma versão italiana dos acontecimentos e o Pai Natal vindo da Escandinávia, via-se logo, não lhes agradava muito. A história da Befana é complexa, mas o senhor resumiu-ma da seguinte forma: esta personagem histórica do folclore italiano, é conhecida por voar na sua vassoura durante o dia seis de janeiro. O seu objectivo é passar pelas casas dos meninos que se portavam bem e dar-lhes presentes. Aos que se portavam mal, dava-lhes carvão e alho. O que a meu ver, era bastante positivo. Bastava juntar um bocado de carne e sal e, voila, tínhamos todos os ingredientes para fazer uma bela febrada.
Acredito que a criançada detestasse a Befana. Enquanto o Pai Natal tem a desculpa de só vir quando eles estão a dormir e ser compreensível eles não o vejam, nunca iria aparecer uma senhora a voar de vassoura à janela deles. A Befana devia ser vista, com um pouco de tacto, como rude. No entanto, o senhor demonstrava grande carinho por esta personagem. O que me leva a perguntar: se gostam tanto dela, porque a queimam?
Sim, o objectivo de ter uma Befana enorme no centro da maior praça da cidade com um enorme monte de paus e palha na base é queimá-la.
O senhor, pessoa bastante informada nesta tradição, disse-me que, de facto, as crianças nutriam um medo especial da bruxa. Não tanto pelo que lhes podia dar, mas porque lhes ia julgar o comportamento do ano transacto. As pessoas, mesmo as mais novas, sabem que não se deve remexer no passado. Especialmente se este contar como tivemos uma apetência especial para a arte da travessura.
Quando cheguei a casa fui ao meu amigo Google prontamente lhe perguntei o que era aquilo. Ele confirmou a conversa do senhor. Mais: ele contou-me que a bruxa iria arder pelas seis horas da tarde. Em Verona, por essa altura, +e noite serrada. (Aqui +e noite serrada às quatro e meia) e, por isso, o espectáculo prometia ser qualquer coisa de extraordinário. Obviamente que a menina Cristiana Santos teve que marcar presença!
Quando sai de casa estava um frio capaz de fazer soltar impropérios – a mesma temperatura que em Moscovo. E sim, eu confirmei – Assim que cheguei à Piazza Brasoube que não ia sentir frio por muito tempo.
Primeiro porque iam queimar a bruxa e uma fogueira com aquele altura ainda devia dar para aquecer a ponta dos dedos. Depois, e o principal motivo, porque estava absolutamente apinhada. Os italianos levam isto de queimar a bruxa mesmo a sério!
Estava tão perdida no meio da multidão que não cheguei a perceber muito bem como é que ela se incandesceu. Contudo, depois acabei por ver um vídeo no facebook Verona Social que me mostrou que foram uns senhores de colete reflector a deitou fogo à estrutura. A imagem do fogo sobre a Arena aquece-nos, mesmo que o calor do fogo nem nos chegue a tocar. Há algo de reconfortante em ver o fogo, uma força destruidora, quando o mesmo é controlado e nos encontramos a salvo. Adoramos os perigos, se soubermos que não nos causaram mal.
A bruxa queimou-se, eu critiquei-me por não ter tirado fotografias para meter no erasmusu e voltei para casa de memória cheia!
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