Vagon Music Pub e Club

Quando me mudei para Praga ao abrigo do programa Erasmus, em 2011, eu ainda não conhecia a cidade profunda, os locais menos óbvios, menos turísticos. Como sou muito ligado à música alternativa e underground, sempre procurei por locais onde pudesse ir a concertos ou conhecer pessoas que com pudesse partilhar interesse musical.

Em 2011, eu ainda era muito limitado em termos música. Pelo menos, olhando agora para trás, percebo que era muito menos eclético que agora e ignorava boa parte do rock mais clássico. Entrei na cena do Punk e do Metal diretamente, sem passar pelas camadas do rock mais comercial, digamos. Daí a lacuna...

Mas isso tudo começou a mudar num certo dia de Agosto de 2011, quando uma amiga checa que conhecera dias antes me convidou para ir a um encontro de pessoas tatuadas. Na época eu não tinha nenhuma tatuagem, mas aceitei. Depois de passarmos a tarde num pub cujo nome não me recordo, fomos, com o grupo de tatuados, a um pub com música ao vivo chamado Vagon, localizado na rua do monumental Teatro Nacional, onde Mozart apresentara pela primeira vez a sua célebre ópera Dom Giovanni, em 1787. 

Talvez naquele momento eu não tivesse percebido, mas aquele dia foi um marco na minha vida enquanto apreciador de música. Eu estava, pela primeira vez, no local que não apenas me fez amar o Rock e o Blues e que tornou Pink Floyd a minha banda favorita, mas também que mudou o meu estilo de vida e levaram os meus esboços libertinos e boêmios ao extremo. Com este texto pretendo não apenas homenagear o Vagon, mas dá-lo a conhecer aos Erasmus ou turistas vão a Praga. Para quem aprecia Rock, sobretudo antigo, não há lugar melhor.

O que é o Vagon?

O Vagon é um pub dedicado ao Rock'n'Roll, sobretudo dos anos 60, 70 e 80. É um antro de nostalgia roqueira, frequentado tanto por pessoas de meia idade como por adolescentes. Seu conceito é perfeito: mistura concertos de bandas "revival" com bandas novas locais, e após os concertos, que ocorrem todos os dias com exceção dos Domingos e Segundas, há música "discotecada" até amanhecer. Nos fins de semana há uma tela colocada atrás do palco e a discoteca se transforma em "videoteca", e as músicas são acompanhadas por seus respectivos videoclips.

Qual o horário de funcionamento?

Durante a semana, das 19h às 05h. Aos Sábados, das 19h às 06h e aos Domingos das 19h à 01h. Os concertos costumam começar sempre às 21h30.

Paga-se entrada no Vagon? Os preços são acessíveis?

Como eu disse, há concertos quase todos os dias com exceção dos Domingos e Segundas. Geralmente, os concertos começam às 21h30 e acabam à meia noite. Esses concertos são pagos, porque as bandas precisam receber pelo seu trabalho, obviamente. O preço da entrada para os concertos costuma variar entre 100,- a 150,- coroas, o que corresponde a 4 e 6 euros. Mas a partir da meia noite, mesmo que a banda ainda não tenha acabado a sua atuação, a entrada é gratuita. Às vezes o Vagon fica tão cheio a partir do horário gratuito que a entrada é barrada e só permitida de forma gestionada, conforme algumas pessoas vão embora, dando espaço a outras. Mas esses dias de superlotação não acontecem com tanta frequência. Vi duas ou três vezes.

Dentro do recinto, os preços são bem baratos, sobretudo por ser um pub situado no centro histórico de Praga, no coração da cidade, da área turística. A cerveja servida lá é a Staropramen e custava 1 euro. Agora aumentou para 1,20, mas ainda assim é barato. Também há outras opções, como a famosa Pilsner Urquell (1,60 euro). A cerveja é sempre de meio litro. As bebidas sem álcool, como refrigerantes, são mais caros que as cervejas (sim, é normal em Praga que a cerveja seja mais barata inclusive que água). Custam cerca de 1,40 (0,33). Uma garrafa de vinho (0,750l) custa entre 6 a 8 euros, e também há as demais bebidas, incluindo as destiladas e espirituosas, cujos preços podem ser vistos aqui.

Qual o perfil de quem frequenta o Vagon?

Varia muito. O Vagon é um pub de Rock, mas todo a sorte de pessoas costuma frequentá-lo. Dos velhos roqueiros de meia idade a jovens punks e metaleiros. De estudantes Erasmus a pessoas que não pertencem a nenhuma tribo urbana. O Vagoin não é um gueto cultural, é um local aberto ao público em geral. Os checos predominam, mas costuma haver muitos estrangeiros também.

Quais os gêneros e as bandas mais frequentes?

O Rock mais antigo tem mais espaço que as novas tendências, claro. As bandas que mais ecoam são Pink Floyd, Beatles, Rolling Stones, The Doors, Queen, Jimi Hendrix, Creedence Clearwater Revival, Led Zeppelin, Deep Purple, ACDC, Black Sabbath...mas também Guns and Roses, Metallica, Red Hot Chili Peppers, Judas Priest, Iron Maiden, Offspring, Green Day, Rage Against The Machine, Rammstein e até algumas coisas mais recentes.

Algum destaque? Algum concerto marcante?

Vários! Em primeiro lugar, a banda Distant Bells, cover de Pink Floyd. Essa banda me marcou muito e me fez começar a dar caa vez mais atenção ao mítico grupo inglês. Devo ter ido a uns 5 ou 6 concertos de Distant Bells! Eles são muito bons músicos e fazem apresentações extremamente fidedignas de Pink Floyd, com um repertório de quase três horas, passando por toda a discografia deles. Destaque absoluto para High Hopes com seu incrível solo tocado com a guitarra havaiana tal e qual David Gilmour.

Há mais destaques, como Jimi Hendrix Experience Revival, cheio de psicodelia e com um vocalista negro de origem estadunidense que é muito idêntico ao Hendrix. Também chama atenção a banda Queenie, que faz o revival de Queen, pela sua enorme qualidade e pelo vocalista, que só não nos faz acreditar que é o próprio Freddie Mercury porque sabemos que ele já morreu.

Por fim, destaco a banda Professor, com um repertório variado, com Beatles, John Lennon, Rolling Stones, Deep Purple, ACDC...Na primeira vez fui ao Vagon eles estavam tocando e ao final pedi para tocarem uma música dos Ramones. É, eu ainda não tinha captado bem o espírito do local, digamos.

Conte algum fato curioso. Algo que tenha sido marcante oue coisas habituais do Vagon. Qualquer coisa que mereça ser contado.

Bem, quando penso no Vagon, a primeira coisa que me vem à mente são as idas para lá. Após tê-lo conhecido por acaso naquele encontro de pessoas tatuadas, comecei a frequentá-lo semanalmente e depois comecei a levar os meus amigos Erasmus para lá. Eu era mito chato! Todas as noites, quando o pessoal da minha residência universitária começava a tentar dcidir para onde ir, eu sugeria o Vagon. Dia após dia. Eu estava apaixonado pelo local de tal forma que mesmo que fosse para outro lugar, dava um jeito de acabar lá a noite. A viagem da minha residência (Hostivar), na periferia da cidade, até ao Vagon durava cerca de 40 minutos com o elétrico número 22. Havia dias em que eu conseguia juntar um grupo enorme de pessoas e íamos todos para o Vagon já meio embriagados. A viagem de elétrico era uma loucura total e por várias vezes tivemos problemas com o comdutor. Certa vez ele até parou o elétrico e se negou a continuar até que fizéssemos silêncio. Não era fácil controlar 30 ou 40 pessoas bêbadas. Este video mostra bem a magnitude da algazarra.

Além disso, o local em si é um antro de perdição em todos os sentidos, inclusive o sexual. Devo confessar que o Vagon era muito mais que um pub de Rock, era onde a libido emanava com fervor e não dava para escapar a ela. Os banheiros do Vagon são conhecidos na cidade pelo sexo que inevitavelmente é praticado neles. E nisso ninguém é inocente. Eu próprio escrevi um poema - parte do meu primeiro livro de poesia, chamado Travessa das Almas - sobre a libertinagem do Vagon. Já flagrei muita gente em pleno ato sexual ali naqueles corredores que levam aos banheiros e sobretudo dentro dos próprios banheiros. Eu próprio usufruí deles algumas vezes. Numa delas fui arrastado por uma menina da pista de dança até ao banheiro masculino. Eram noites selvagens, mas nem sempre era assim, claro. Alguns dias eram calmos.

Certa vez, já muito tempo depois do meu Erasms, em 2013, fui selecionado para participar de um programa de uma emissora brasileira chamado O Mundo Segundo os Brasileiros - Praga. Como o tempo era curto e a ideia era mostrar mais o dia-a-dia de cada participante em vez dos habituais pontos turísticos da cidade, tive a ideia de apresentar o Vagon ao mundo. Ou pelo menos aos brasileiros. A minha participação no programa durou um dia inteiro. Comecei pelo meu pub favorito, para falar sobre a famosa cerveja checa. Depois mostrei um jogo de hóquei no gelo (não que eu seja fã desse esporte, mas foi um pedido da produção), e à noite fomos gravar no Vagon. Estava tendo um concerto de uma banda de Punk Rock local. Foi interessante estar lá com uma repórter um cameraman com uma câmera enorme no meio daquela loucura. O resultado pode ser visto a partir do minuto 44:30 deste video.

Considerações finais.

Para quem for estudante Erasmus ou turista, o Vagon apresenta-se como um local idel para conhecer pessoas locais. Do lado contrário ao palco e à pista de dança, há um espaço com várias mesas onde as pessoas ficam sentadas bebendo cerveja. Os checos não são as pessoas mais simpáticas do mundo, mas conheci muita gente durante as noites do Vagon, entre goles de cerveja e muito Rock'n'n'Roll.

Ah! Uma coisa importante que precisa ser dita: nunca deixe o seu casaco fora de vista. Não o coloque num lugar qualquer. Há um bengaleiro no Vagon e recomendo que deixe os casacos lá. O preço é irrisório. Caso contrário, há risco de furto, como já presenciei algumas vezes. Como a entrada após a meia noite é gratuita, há pessoas que entram no Vagon para roubar. Não é algo que aconteça com tanta frequência, mas acontece, e nunca sabemos quando. 

Fora isso, o local é amigável e seguro. Não me lembro de brigas ou cenas violentas. É um local para conhecer pessoas, fazer amigos checos e ouvir boa música. Aproveitem! Para mim é um local mítico que ainda será tema de uma das minhas futuras tatuagens.